quinta-feira, 12 de setembro de 2019

O mundo dourado em sua mesa - Diorama

 
Obra de George O'Keeffe

           É bem difícil encontrar uma pessoa que não se encante com uma bela maquete, uma miniatura bem-feita, ou um diorama com grande riqueza de detalhes. Eu conheço gente assim, por isso posso dizer que é uma minoria indigna de qualquer estatística séria. No máximo traço de gráfico. Principalmente para quem não tem disponibilidade de espaço, seja em casa, seja em um espaço alugado ou cedido, uma coleção de miniaturas de boa qualidade enriquece muito qualquer ambiente, ainda mais quando se trata de um vintagista, que geralmente tem bom gosto acima da média. Há quem compre maquetes de lançamentos imobiliários, quando a obra fica pronta e as unidades já foram vendidas… uma maquete de trinta andares cabe na sala e, ao contrário do edifício, pode ser admirada em todos os ângulos e decorada ao gosto do dono, para efemérides, sem precisar da autorização do condomínio.

            Mesmo aqueles que podem ter os objectos originais, às vezes principalmente essas pessoas, têm um brilho quase pueril no olhar, ante a possibilidade de ter uma versão menor, que possa ser apreciada de modo que as dimensões do original não permitem. No caso de um carro, admirar a parte de baixo sem precisar de um elevador de oficina, e sem o risco de um acidente fatal, é uma terapia para conhecedores. Isso além do facto de que alguns carros são tão raros e disputados, que é mais fácil conseguir as fortunas que eles custam, do que alguém disposto a vender o seu. Já soube de um divórcio, nos anos 1980, por conta de um Duesemberg… a miniatura mais avantajada, cara e ricamente detalhada, não teria causado isso.

Elgin Park e uma de suas obras

            Vamos ao básico. As diferenças fronteiriças entre miniatura, maquete e diorama não são rígidas e digitais, na verdade são muito analógicas e às vezes a linha que os divide é larga e difusa, como as próprias fases das décadas passadas.

            Miniatura é justamente o que o nome diz, uma versão menor do que o objecto representado. É como um genérico de maquete e diorama. Se fosse do mesmo tamanho, seria réplica, que é outra coisa e outro assunto para um texto futuro. A miniatura pode ser um simples brinquedo mais sofisticado, com boa dose de detalhismo para alegrar uma criança, mas também pode ser uma réplica em escala; um modo chique para denominar versões menores que são tão ricas em detalhes e em que as partes funcionam de modo tão fiel ao original, que uma boa sessão photográphica enganaria até mesmo experts, fazendo-os pensar que se trata de um original.

            Maquete é uma representação em tamanho menor de uma obra de grandes dimensões, mais utilizada na indústria da construção para que os potenciais clientes tenham uma idéia precisa do que pretendem comprar… ok, sabemos que muitas vezes existe uma distância astronômica entre o que é apresentado, e o que é realmente entregue, mas isso é um problema para o Procon, a polícia e o senso de direito e união de consumidores, que o brasileiro não tem. Enfim, a maquete é a miniatura levada ao profissionalismo, mas por isso mesmo se tornando algo mais, pela necessidade de dados e história e/ou prognósticos de que uma mera miniatura prescinde. E um prognóstico nada mais é do que uma especulação, por mais embasamento que tenha, da história futura. E história é justo o que conta uma réplica em escala de um P-47 Thunderbolt, por exemplo.


            Diorama… não, não me refiro a um evento da Dior e nem à pequena cidade do interior de Goiás. Diorama é quando a maquete é contextualizada no espaço-tempo. Por exemplo, uma réplica em escala de uma parede em ruínas com um piso de época e um soldado morto, se tiver bom grau de realismo, é um diorama de guerra, ainda que seja guerra urbana. E é aqui que o diorama se põe no topo da hierarquia dos três, existe a necessidade de realismo, o que quase sempre o torna mais caro e difícil de produzir do que uma simples (?) maquete. Um bom diorama pode levar anos para ficar pronto, mesmo ocupando o espaço de uma pesa pequena.

            A rigor, o primeiro diorama de verdade é o bonsai, ou pelo menos o seu precursor. Surgido na China do século VIII, caiu rapidamente no gosto dos japoneses, com suas sérias restrições de espaço, em especial dos monges, estes então podiam ter uma boa lembrança de um lugar sem precisar se apegar a ele, e sem possuir mais do que é capaz de carregar. Por volta do século XVIII o bonsai atingiu o estado de arte de que desfruta hoje, com técnicas tão refinadas que mesmo as menores versões podem ser capazes de gerar flores e frutos, reagindo às estações do ano como qualquer árvore normal. Isso, em um cenário em escala, é o suprassumo do realismo.

            É aqui que as cosias complicam para as pessoas comuns. Bonsais não são baratos e nem muito simples de se manter. Eles precisam de cuidados a mais do que uma simples planta pequena, o que inclui uma poda periódica das raízes, ou a planta vai crescer mais do que o desejado e, tristeza, deixar de ser um bonsai; o crescimento é irreversível. Assim como há pouca gente fazendo bonsais no Brasil, também há poucas aptas a prestar os devidos cuidados, o que dificulta e encarece sua manutenção.

            Embora as partes não vivas de um diorama não cheguem a esse nível de drama, a qualidade do cenário tem preço proporcional, não só em dinheiro, mas também em procedimentos e tempo empregados, tanto na produção quanto na instalação, se for o caso, e na manutenção. Para a alegria dos adeptos desse hobby, que é algo um pouco além de um mero passatempo, por seu caráter de perenidade, a indústria dos cenários em escala produz muita coisa nas escalas oficiais, o que poupa tempo e dinheiro… mas não muito. Figuras de pessoas e animais, plantas, trilhos ferroviários, mobília, cercas, fachadas, veículos, acessórios e uma infinidade de coisinhas que talvez ninguém saiba quantas realmente sejam.

            Essa é a boa notícia.

   
            A má notícia é que é QUASE TUDO importado… e muitas vezes a importação é independente, ou seja, por conta e risco do consumidor final. A feitura do diorama é quase como o restauro de um carro antigo, dificilmente o prazo e o orçamento serão aqueles previstos, sempre aparece um problema. Murphy não descansa. É aqui que entram a arte e o talento da improvisação, tão desenvolvidos no brasileiro… e não, a casa da Barbie não é um diorama. A própria boneca não é realista o suficiente para isso, o que não significa que seus caros acessórios não permitam fazer um belo cenário de época, podem e os fãs mais bem remunerados montam alguns de rara beleza, mas tudo ainda fica com cara de brinquedo. Se é para te fazer feliz, vale sim.

            Para o nosso caso, que seria um diorama de época, bastam um pouco que pesquisa séria com imagens, alguns vídeos temáticos e, se for o caso, consulta a pessoas que se dedicam a estudar o assunto; o YouTube está bem servido delas, não é muito difícil. O mais simples é fazer um cômodo aberto com duas ou três paredes e os móveis. Um quarto, por exemplo, pode ser feito sobrepondo e colando duas caixas de sapatos, que podem ser decoradas com imagens baixadas da internet, devidamente redimensionadas, incluindo papel de parede e piso. Um pouco de habilidades manuais é necessário, porque será preciso recortar, modela e até pintar, por menores que sejam as intervenções. Palitos de espetinho podem tanto reforçar as paredes, quanto formar a estrutura da mobília, com palitos de dentes formando as partes mais delicadas. Retalhos de tecidos, vendidos por uma ninharia, serviriam para a roupa de cama, tapetes e as cortinas, com arremates feitos com cola. Tudo isso pode ser feito em um dia ou dois de trabalho dedicado, com, pelo menos, mais um para tudo ficar curado e consistente para ser levado consigo.

   
             Claro que isso é uma orientação genérica e já considerando que vocês já têm alguma habilidade manual; aqui não dá para se partir do zero absoluto. A receitinha básica e genérica que dei pode ter resultados surpreendentes, para quem tiver paciência e perseverança, se precedidas de uma boa pesquisa de época, algo fácil com a internet; principalmente para quem já tem em mente o que quer. Vocês são no mínimo entusiastas do modo de vida de outras épocas, então vocês têm sim ao menos noção do que querem, alguns até sabem com precisão o que desejam, isso facilita muito mais do que vocês imaginam; poupa muito dinheiro, muito tempo, muitos aborrecimentos e até acidentes de trabalho.

            O passo seguinte é usar chapas de mdf para fazer tudo, mas então a tesoura de costura e a faquinha de mesa não servem mais, é necessário ter ferramental apropriado, embora nada de sofisticado. Algumas lojas fazem corte e modelação a pedido do cliente, não todas, e nem todas o fazem sem custo adicional, mas é uma opção para quem não quer ou não tem condições de fazer a parte pesada do serviço. Felizmente uma chapa mais fina serve bem para nossos propósitos, por menos de R$15,00 dá para comprar uma boa placa crua de 50X50cm, o que é bem grande para um diorama de mesa. Infelizmente as ferramentas adequadas não são tão baratas, porque é um material relativamente resistente e duro, por isso é uma boa idéia terceirizar o corte, porque um erro pode por tudo a perder.

            A grande vantagem dessas chapas é a versatilidade, e poder se conseguir um bom grau de detalhismo, desde que o ferramental e a mão de obra sejam os adequados. Dá para reproduzir até as charmosas cadeiras de madeira curvada, muito em voga até os anos 1940. Com o tempo e a prática, seus movimentos para corte e moldagem estarão quase automatizados, será quase como cortar papelão.

Explosão feita com algodão e muita técnica

            A partir daqui a coisa fica realmente mais cara, demorada e sofisticada, sendo recomendável um curso de artesanato ou profissional, porque qualquer erro pode significar jogar tudo fora e fazer de novo. É o mundo dos profissionais, que chegam ao requinte de produzir seus próprios materiais de trabalho, transformando chumbo em ouro; como pegar uma miniatura barata, trabalhar cada detalhe e extrair dali uma réplica em escala de primeira qualidade. Mas isso é para quem perseverar e, quiçá, decidir fazer disso um negócio, então um estúdio com um laboratório anexo, nos moldes de um bom atelier, pode fazer parte de seus planos. Não que eu queira que vocês trilhem esse caminho, é apenas uma amostra do imenso horizonte inexplorado que os brasileiros têm à frente, mas ao qual não avançam.

            Até mesmo vocês vão sofrer alguns aperfeiçoamentos, seus subconscientes trabalharão e se fixarão em pedaços sólidos tridimensionais de expressão, o que não só fará vocês se reconhecerem bem naquele diorama, como também fará as pessoas próximas e talvez um psicoterapeuta, perceberem uma melhoria de comportamento que poderá ser útil, não só a saúde mental, como também na vida profissional e social. Não só isso, a vida escolar é muito potencializada. Aqueles trabalhos sobre base de isopor que as crianças fazem, podem ser considerados rudimentos de um diorama e, se os adultos soubessem estimular em vez de simplesmente pressionar, o envolvimento de todos os sentidos tornaria o aprendizado não só mais rápido, mas também indelével. Pois é, muitos de vocês são miniaturistas e ainda não se deram conta, talvez porque foram mal apresentados à arte.

Obra de Elgin park

            Como tudo o que fica acima da linha de cintura, a arte da miniaturização é ignorada ou mesmo malvista no Brasil. Lá fora, desculpem o clichê, existem empresas especializadas em suprir o mercado de amantes e profissionais da área, inclusive com a possibilidade de se comprar casas de época, em várias escalas, completas! Com precisão de medidas e riqueza de detalhes de fazer inveja a muitas casas de verdade. Imaginem poder encontrar aqui, casas, carros, trens, trilhos, árvores, animais e figuras de pessoas, tudo pronto para montar sua cidade de época; ou no máximo personalizar peças para que fiquem ao seu gosto. Imaginaram? Vão sonhando, porque pelo menos isso ainda é grátis. Aqui há poucas lojas, em poucas cidades, com comparativamente poucas escolhas a preços relativamente elevados, mesmo para os padrões dos miniaturistas profissionais. Decerto que a nossa baixíssima demanda conspira contra.

Obra de Elgin Park

            Um expoente dos dioramas de época é Elgin Park. Ele costuma fazer ensaios primorosos, que mesmo os olhos mais bem treinados têm dificuldades em identificar como cenários em escala. Ele é um homem insuspeito, em seu aspecto até bucólico, mas domina técnicas altamente sofisticadas, unindo seu vasto cabedal a um talento artístico raro. Um pequeno carrinho a controle remoto, com uma câmera no lado do motorista, faria qualquer um se ver entrando em uma rua dos anos 1950, mesmo aplicando o zoom. A questão aqui é que um miniaturista do naipe de Park, sabe adequar a textura do objecto real às dimensões reduzidas do diorama. É esse o segredo e é essa a dificuldade maior, os materiais usados na vida real não terão sua granulação reduzida só por serem cortados em tamanhos menores, ou utilizados em porções menores. A água, por exemplo, tem viscosidade fixa, de acordo com a pressão atmosférica e a temperatura ambiente, assim um curso d’água em escala nunca terá o comportamento de um natural, o mesmo valendo para o vento. Uma miniaturização de alta ou extrema qualidade, não pode simplesmente utilizar a mesma matéria utilizada no tamanho real, não sem adaptações e até manipulação da fórmula. Daí a necessidade de estudar e praticar, como em tudo na vida, para fazer aquele diorama que bem poderia ser cenário de um filme.


            Algo que um vintagista pode fazer por si mesmo, é estudar o bairro onde seus avós viveram e, quem sabe, conseguir reproduzir a casa de onde seus pais saíram. Advirto que se trata de uma tarefa extenuante, sem prazos plausíveis, e dependendo do caso pode ficar bem caro. Mas a satisfação de uma casa antiga, em que suas lembranças caminhem junto com seus sonhos, com um ou dois bonsais ladeando e um carrinho antigo na garagem, poderá fazer milagres desde o início do planejamento, até o dia em que ficar exposta no local definitivo.

            Existem pelo mundo muitas cidades em miniatura, com precisão de medidas e riqueza de detalhes, que certamente vão inspirar vocês. Algumas têm visitação pública. Os temas são os mais variados, mas sempre inspiradores.


            A minha intenção aqui não é transformar o Brasil em um polo mundial do miniaturismo, ainda mais o de época, apesar de que eu ficaria muito satisfeito com isso. Meu intento é dar aos leitores uma opção sadia e orientações mínimas para ocuparem seu tempo, e de quebra aumentar seu cabedal cultural, porque muitos dos que começam com quartinhos de caixas de sapatos, simplesmente não param mais de se aperfeiçoar. E, no caso de vocês, mais um canal para expressarem e se enxergarem nas suas épocas preferidas. Com o aprimoramento da técnica, o aprimoramento pessoal é virtualmente uma conseqüência.

Ali Alamedy trabalhando

        Então, vintagistas, animados? Que tal um pedaço do mundo do cinema clássico em exposição permanente na sua sala de estar? Com o tempo, quem sabe, uma cidade inteira...

Sobre a obra de Elgin Park, pela lente de Michael Paul Smith, aqui e aqui.

O miniaturista profissional Ali Alamedy.

O miniaturista profissional George O’Keeffe.

O brasileiro Leo de Castro.

Algo sobre outros miniaturistas brasileiros, ainda desbravadores, clicar aqui.

Tutoriais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

Um comentário:

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